Moacir Gadotti
Quando falamos em movimento social vem logo à mente a idéia dos chamados “setores organizados” da sociedade por lutas específicas: terra, moradia, saúde, transporte, segurança, educação, etc. Mas a grande massa da população não está organizada em movimentos como sindicatos e partidos. Ela está organizada na informalidade ou em clubes, igrejas, pequenas associações, etc. Por isso precisamos alargar o conceito de “organização social”, de “movimento social”, permitindo a inclusão na interlocução, na caminhada democrática, dessa grande massa de pessoas que, em geral, não têm voz na sociedade.
Precisamos ainda reconhecer que existem muitas contradições no seio dos movimentos sociais. No mundo religioso, por exemplo, existem movimentos libertários ao lado de movimentos reacionários. Estar num movimento social não dá certidão de progressista a ninguém. Freqüentemente caímos na armadilha de formalizar, de burocratizar por demais o conceito de “organização social”. A força desses movimentos “não organizados” foi dada nas últimas eleições ao votarem, pela primeira vez, majoritariamente, em Lula. Esse é ainda um grande espaço aberto para a “expansão” dos chamados movimentos sociais.
Paulo Freire insistia muito na incorporação desses setores informais. Dizia ele que nós, educadores, deveríamos escutá-los mais. Hoje estamos mais atentos a essa questão. Não menosprezamos organizações não-formais. Mas muitos ainda as tratam como setores “desorganizados”. Os novos movimentos sociais vão a eles. As escolas deveriam fazer o mesmo. Não só abrir-se para a população e esperar, de porta aberta, que eles entrem. Mas ir a eles, aprender com eles.
Todos esses movimentos estão se constituindo, por meio dos Fóruns, em espaços de auto-organização, em rede, onde “todos podem caber”, como dizia Paulo Freire. Os Fóruns são espaços de convivência, de convivialidade. O Fórum Social Mundial é um processo global que tende a se multiplicar pelo mundo como espaço de libertação. Não é uma instituição ou uma organização. Só assim ele pode cumprir sua missão de incorporar, de forma pluralista, todos os setores que se identificam na luta contra o neoliberalismo.
Os movimentos sociais são muito importantes não apenas pelas causas que defendem mas, sobretudo, porque eles construíram um novo imaginário social. Além da ética na política, eles mobilizam o desejo de mudar, a crença na capacidade do ser humano de mudar. Eles mostraram que “outro mundo é possível” e construíram outra forma de representação que não passa pelos canais tradicionais, mas pela força da organização de base comunitária, pluralista, na sociedade global. E isso é muito novo no campo democrático, popular e socialista.
- O que os movimentos sociais estão nos ensinando?
Eles nos ensinam que o povo, as pessoas, se educam na luta, em comunidade. A luta é pedagógica. Os brasileiros tem uma rica cultura “de experiência feita”, como dizia Paulo Freire. Esse saber, essa cultura, nem sempre foram valorizadas pelas nossas academias, pelas nossas Universidades, que têm muito a aprender com os movimentos sociais. O saber que vem das lutas. Esse é um grande espaço de aprendizado.